quarta-feira, 3 de setembro de 2008

Carta de Princípios

Comitê Catarinense Contra a Criminalização dos Movimentos Sociais

Carta de Princípios

1.. O Comitê Catarinense Contra a Criminalização dos Movimentos Sociais reúne lideranças e entidades democráticas e populares que se oponham a que sejam criminalizados os diversos movimentos sociais em luta por suas reivindicações econômicas, educacionais, culturais, políticas e sociais

2.. O Comitê atuará no sentido de assegurar o exercício dos Direitos e Garantias Fundamentais inscritos na Constituição do Brasil e no âmbito do direito internacional mais progressista, objetivando a livre expressão, manifestação e organização dos movimentos ameaçados nesta e em futuras conjunturas em função das suas atividades contra as desigualdades sociais

3.. O Comitê é independente e autônomo frente a empresas, partidos políticos e órgãos da mídia e do Estado em qualquer nível

4.. O Comitê buscará de modo permanente evitar o surgimento e o desenvolvimento de novas formas de totalitarismo e controles anti-democráticos por meio do debate público e do fornecimento de análises de medidas criminalizadoras adotadas pelo Estado, empresas, órgãos da mídia e indivíduos que internalizaram com naturalidade a repressão às lutas do povo

5.. As posições do Comitê serão expressas publicamente em documentos escritos, após deliberação coletiva e divulgação prévia a todos os seus integrantes, buscando dentro da diversidade da sua composição, a construção de posições políticas pelo método do consenso

6.. Constitui objetivo do Comitê a intervenção ativa contra abusos e ilegalidades cometidas em desfavor dos lutadores e lutadoras sociais, valendo-se de todos os meios legais para a sua reparação e/ou eliminação

7.. O Comitê buscará manifestar-se nos meios de comunicação social para esclarecer fatos envolvendo as lutas sociais que tenham sido deturpados pela mídia e que possam contribuir para criminalizar pessoas e movimentos

8.. A abrangência do raio de ação do Comitê se circunscreve ao âmbito da salvaguarda das liberdades democráticas - entendidas no seu sentido mais amplo - não se confundindo com outras organizações da sociedade civil que tenham finalidades parcialmente afins, porém com as quais empreenderá esforços para realizar a unidade de ação no que couber

9.. O Comitê fará a denúncia de todo autoritarismo, inclusive os que se apresentarem sob a forma de medidas de segurança, dentro do entendimento de que é um dos principais fomentadores da violência na sociedade

10.. O Comitê, ao defender os movimentos sociais, espera contribuir para a construção de uma sociedade justa, democrática e sem arbitrariedades.


A presente proposta de Carta de Princípios do Comitê Catarinense contra a Criminalização dos Movimentos Sociais, que doravante norteia a atuação do Comitê e a participação de seus integrantes foi aprovada no dia 29 de novembro de 2005, na sede do Sindicato dos Empregados em Estabelecimentos Bancários de Florianópolis e Região, na rua Visconde de Ouro Preto, 308, Centro, Florianópolis, Santa Catarina.
 

Mauri Antonio da Silva - relator

CARTA ABERTA

CARTA ABERTA AO REITOR DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA – UFSC

Magnífico Senhor Lúcio Botelho

Nós, cidadãos e militantes das causas democráticas e populares formamos o COMITÊ CATARINENSE CONTRA A CRIMINALIZAÇÃO DOS MOVIMENTOS SOCIAIS, em defesa das liberdades e direitos democráticos duramente conquistados pela luta do povo e dos trabalhadores brasileiros e contra a ofensiva antidemocrática de criminalização dos movimentos sociais.

Entendemos que toda tentativa de criminalização dos acadêmicos desta Instituição de Ensino Superior, derivada da sua participação na reunião do Conselho Universitário ocorrida em data de 18/10/2005 quando as portas do auditório foram fechadas, seja na esfera da polícia federal, seja perante o Judiciário ou administrativamente, nesta Universidade de larga tradição democrática, constituem-se em insofismáveis ações de repressão política contra a liberdade de organização, expressão e reivindicação, que abalam a credibilidade não só das autoridades responsáveis pela segurança pública, como também de todas as Universidades brasileiras, conhecidos centros de irradiação democrática e participativa.

Consideramos necessário que a situação dos alunos bolsistas seja resolvida com agilidade e justiça, de forma imediata, e com ampla participação da comunidade universitária.

Solicitamos respeitosamente vosso compromisso efetivo de que os acadêmicos que participaram da reunião do Cum, no dia 18/10/2005 não serão processados administrativamente, nem sofrerão perseguição política de nenhuma espécie, ou determinando o arquivamento imediato dos processos que eventualmente já tenham sido instaurados.

LIBERDADE DE MANIFESTAÇÃO PARA OS ESTUDANTES DA UFSC
CONTRA A CRIMINALIZAÇÃO DOS MOVIMENTOS SOCIAIS
PELAS LIBERDADES DEMOCRÁTICAS

Atenciosamente

COMITÊ CATARINENSE CONTRA A CRIMINALIZAÇÃO DOS MOVIMENTOS SOCIAIS

Carta de esclarecimento à população

04/11/2005 - EM TEMPOS DE EMBUSTES UNIVERSAIS, DIZER A VERDADE SE TORNA UM ATO REVOLUCIONÁRIO. GEORGE ORWELL.

Os trabalhadores e estudantes da Universidade Federal de Santa Catarina decidiram divulgar esta nota de esclarecimento à comunidade, com o propósito de propiciar um diálogo que restabeleça a verdade e informe sobre acontecimentos que têm sido veiculados de forma tendenciosa, arbitrária e discriminatória, na tentativa de desqualificar, deslegitimar e até criminalizar os sindicatos e o movimento organizado dos estudantes da UFSC. Antes de tudo, é preciso esclarecer que os técnicos-administrativos, docentes e estudantes estão em greve acompanhando o movimento nacional de luta que eclodiu em agosto, em todo o país, e só vem crescendo desde então, por conta do descaso do governo com a educação e a má vontade do mesmo em negociar com os grevistas.

Atitude semelhante tem adotado a reitoria da UFSC, que quase dois meses do início da greve, sequer tomara a iniciativa de reconhecer a existência da greve na instituição. Somente sob protestos e pressão do movimento aceitou convocar o Conselho Universitário (CUn), para discutir uma pauta coletiva que inclui temas essenciais para o movimento universitário. No entanto, a negação do compromisso firmado – de votar o aumento do valor das bolsas estudantis - provocou o acirramento dos ânimos durante sessão do CUn, na terça-feira, 19 de outubro, culminando com o fechamento das portas do auditório da reitoria.
Essa foi uma tentativa desesperada dos estudantes de procurar resolver o impasse criado por uma manobra que, mais uma vez, adiava uma situação que vem se arrastando desde maio deste ano. O problema das bolsas já provocara um movimento grevista dos bolsistas em junho, não só pelo aumento, mas também pela mudança na regulamentação das bolsas, que estão em muitas situações gerando ilegalidade, pois levam estudantes a substituir trabalhadores, fazendo tarefas para as quais não estão qualificados e completamente fora de sua área de estudos. Como disse um estudante durante a sessão interrompida do CUn, inconformado com a negativa de cumprir o acordo de decidir o novo valor das bolsas: - Estamos sempre expulsos da universidade, porque a fome e o aluguel não esperam...E depois a universidade faz estudos para entender os motivos da evasão nos cursos!
Para restaurar a verdade dos fatos é importante lembrar que a convocação do CUn foi decidida após acordo feito com os estudantes, que ocuparam o gabinete do reitor por 51 horas, e que, após esse compromisso, assumido pelo reitor Lúcio Botelho, os sindicatos dos professores e dos técnicos-administrativos – Apufsc e Sintufsc – que haviam buscado abrir canais de diálogo para o impasse, foram chamados pelo próprio reitor para acordar, conjuntamente com os estudantes e a administração, a pauta dos debates no CUn, que contemplaria dois temas de interesse de cada categoria (bolsas, construção da terceira ala do RU, reconhecimento da greve nas três categorias, plano de saúde para os servidores técnicos e docentes, jornada de 6 horas para os trabalhadores técnico-administrativos e situação dos professores substitutos).
Os fatos da terça-feira só aconteceram porque a votação do valor das bolsas foi barrada por uma proposta que feria o compromisso assumido com o movimento e que fora reiterado na sessão anterior do CUn, realizada em 10 de outubro, que adiara para a sessão seguinte, a do dia 19, a votação da proposta de reajuste de 250 reais para 330 reais.
Tendo o acordo sido derrubado, quando as portas do auditório foram fechadas na tentativa de retomar o processo negocial que havia sido rompido, o reitor, o vice-reitor e a maioria dos conselheiros sequer se empenharam, como trabalhadores em educação que deveriam ser naquele momento, em buscar superar o impasse através do diálogo real. Sequer buscaram acalmar os ânimos quando dois grupos de estudantes estiveram à beira da contenda física. E o mais grave, segundo denúncia de uma conselheira-representante dos estudantes no CUn e participante da comissão das bolsas – o próprio vice-reitor a ameaçou, prometendo: “Tua cabeça vai ser a primeira a rolar”.
Não foi apenas o vice-reitor que se dirigiu de forma imprópria para o cargo de dirigente universitário. O reitor também tentou intimidar filiados e coordenadores do Sintufsc, que buscavam uma saída negociada, afirmando que ele sabia muito bem quem estava “insuflando os estudantes.” Não é a primeira vez durante esse longo período de luta que a administração da UFSC age de forma pouco condizente, fazendo provocações, procurando lançar o pomo da discórdia e dúvidas sobre o comportamento de dirigentes sindicais, na tentativa de criminalizar o movimento de luta na universidade.
No dia 20 de setembro o mesmo expediente foi usado pelo vice- reitor Ariovaldo Bolzan que chamou os professores e técnicos para conversar sobre os fatos acontecidos no Centro de Eventos da UFSC no domingo anterior, dia 18 de setembro. Em vez de explicar porque estudantes foram impedidos de entrar no Centro de Eventos privatizado, acabou fazendo acusações graves ao afirmar que os sindicatos estariam financiando “infiltrados” no movimento dos estudantes. A reunião contou com presença de dois pró-reitores e o chefe de gabinete, e nela o vice-reitor declarou que as empresas e entidades que alugam o centro de eventos trazem os seus próprios seguranças, o que configura uma ingerência na vida da universidade pública. Os dois sindicatos insistiram sobre o fato de que os trabalhadores da segurança estão despreparados para lidar com os movimentos de luta e que é inadmissível que continuem usando gás de pimenta e armas – ainda que de plástico – para intimidar estudantes e trabalhadores.
Naquela ocasião se insistiu com o vice-reitor de que, se há um dossiê feito sobre os “infiltrados” entre os estudantes, como ele informou, que a administração da UFSC tratasse de fazer uma investigação sobre os empresários infiltrados na UFSC pública que, há anos, sugam a estrutura, os bens e os trabalhadores da instituição.
A mesma Reitoria que agora promete tratar com rigor estudantes pobres, absurdamente acusados de manter conselheiros em “cárcere privado e extorsão mediante seqüestro”, porque estão lutando para se manter nesta universidade pública, não toma qualquer providência nem investiga uma fundação estrangeira que, sem qualquer convênio formal com a UFSC, se apropriou de espaços públicos da universidade, salas de aula, sala de multimídia, corredores, sanitários, computadores, telefone, data show, contratando bolsistas sem editais públicos, entre outras irregularidades.
Diante dos acontecimentos, manifestamos nossa indignação e perplexidade com o fato de que numa instituição pública, dedicada ao ensino, pesquisa e extensão, não haja empenho das autoridades universitárias, eleitas pela comunidade, em agirem como educadores. Ao contrário, são os próprios dirigentes que tentam desqualificar o movimento estudantil autônomo e pensante, querendo levar a crer que ele se preste a ser massa de manobra de sindicatos e trabalhadores em greve, que os estariam insuflando. É lamentável que sequer reconheçam a dignidade de meninos e meninas que têm a coragem de expor seus corpos ao perigo, correndo o risco de sofrerem punições e responderam a processo – como tem sido dito – apenas porque lutam pelo direito de estudar e pela manutenção da universidade pública, tão ameaçada de morte por tantos males que a atacam dentro de suas próprias entranhas.
ASSEMBLÉIA GERAL DOS TRABALHADORES TÉCNICO-ADMINISTRATIVOS DA UFSC
COMANDO DE GREVE ESTUDANTIL DA UFSC


FONTE: http://www.sintufsc.ufsc.br/noticias_2005/1104_carta.htm

quinta-feira, 28 de agosto de 2008

Breve Histórico

No ano de 2005 a cidade de Florianópolis, capital de Santa Catarina, foi cenário de intensas mobilizações e protestos de praças, estudantes e trabalhadores, levando a oligarquia do Estado processar juridicamente lideranças destas diferentes categorias. Os movimentos sociais, diante da necessidade de se defenderem, buscaram se unir em torno de uma bandeira que estava e está acima de divergências pontuais: a luta pela não criminalização dos movimentos sociais.

A construção do Comitê Catarinense Contra a Criminalização dos Movimentos Sociais se dá a partir de um caso bastante peculiar: a luta pela liberdade de Amauri Soares, um militante das causas populares e, especificamente, da categoria dos policiais e bombeiros de Santa Catarina. Em 2001 Soares, juntamente com outros policias e bombeiros, fundou a APRASC (Associação dos Praças de Santa Catarina), que desde então luta por melhores condições de trabalho da categoria, questiona o papel repressor da polícia à serviço do Estado e se une a outras categorias, para lutar por direitos, como da Saúde, da Educação, dos Trabalhadores Rurais,. Ao longo de sua breve história a APRASC realizou mobilizações como greve (embora proibida), marchas e denúncias que foram consideradas um desacato pelos órgãos máximos da polícia e do Estado que não permitem a sindicalização dos policiais. Inúmeros processos e prisões administrativas foram realizados contra as principais lideranças. Em 2005 Soares sofria um processo que poderia levá-lo a dois anos de prisão. Movimentos populares em geral unificaram-se num comitê pela sua liberdade, que em outubro de 2005 foi transformado no CCCCMS, pois se considerou que a perseguição a este líder popular fazia parte de um conjunto de repressões a todos os movimentos sociais que lutam contra a ordem de exploração e de domínio do capital estabelecido nesta sociedade.

Juntamente com o caso de Amauri Soares, também foi ponto de pauta na luta do Comitê os processos contra os militantes do MPL (Movimento do Passe Livre), movimento que foi protagonista nas manifestações contra o aumento das tarifas em maio de 2005, conhecidas como Revolta da Catraca. Estas manifestações duraram três semanas consecutivas, 30 pessoas foram presas, várias ficaram feridas e os militantes Marcelo Pomar, Flora Muller e André Moura Ferro foram processados por formação de quadrilha, perturbação da ordem pública, entre outros.
 
Em outubro também de 2005, cerca de 200 estudantes da UFSC ocuparam o Conselho Universitário da UFSC numa manifestação que durou mais de cinco horas, pelo aumento das bolsas de trabalho e conversão destas em Bolsas de Pesquisa. Embora, os estudantes tenham conseguido vitória na sua reivindicação, até hoje, 21 estudantes sofrem processos administrativos e judiciais, além de 5 técnicos administrativos que os apoiaram. Em fase de inquérito, os processos podem levar a expulsão destes estudantes, bem como à prisão, pois estão sendo acusados de formação de quadrilha, cárcere privado, entre outros “crimes”.

Os dois primeiros casos foram arquivados, mas as razões para existir o CCCCMS aumentam a cada dia, além do caso dos estudantes e trabalhadores da UFSC que continua em aberto (os demais foram arquivados), em 2008, Marcelo Pomar estava sendo acusado acusação de incitação ao linchamento, após ter-se defendido de ataque de capangas numa panfletagem que realizava o MPL pelo Passe Livre. Em sua defesa e contra esta injustiça, cujo caso também foi arquivado, em 28 de maio de 2008 foi realizado uma Audiência Pública na ALESC sobre a Criminalização dos Movimentos Sociais, na qual participaram sindicatos, partidos, entidades, deputados, associações comunitárias, entre outros movimentos sociais e personalidades que denunciaram as graves perseguições aos movimentos sociais no estado de Santa Catarina e exigiram do Estado o direito de reivindicação.

Desde a realização desta audiência, o CCCCMS busca reorganizar-se, após ter passado por um período de desarticulação, pois consideramos que este espaço é imprescindível para que os movimentos sociais não sejam desmantelados pelos órgãos repressores e mantenedores da ordem de exploração e opressão capitalista. O espírito da Ditadura Militar infelizmente ainda não foi destruído e busca fortalecer-se a través dos órgãos judiciais, de repressão, dos grupos paramilitares e outros setores que de forma hipócrita tratam os lutadores e as lutadoras do povo como formadores de quadrilha e bandidos.

Movimentos populares como o MST e o MAB, assim como todos os sindicatos e entidades de luta, hoje, no nosso estado e em todo o país, sofrem algum tipo de perseguição. Sabe-se que esta é a forma encontrada para impedir a construção do poder popular rumo a uma sociedade sem exploração e opressão. Portanto, hoje, a unidade contra a criminalização dos movimentos sociais é mais do que uma questão de consciência, é uma necessidade para aqueles que pretendem continuar na luta e a compreendem como única forma de acabar com a situação de miséria e violência que vive nosso povo.

Convidamos a todos lutadores e lutadoras a se integrarem ao Comitê e fazer dele um espaço de resistência e avanço de nossas lutas!